11/02/2016

Floresta regenerada é esponja de carbono, dizem pesquisadores


Um consórcio internacional de cientistas, que inclui gente de diversas instituições de pesquisa do Brasil, acaba de publicar no periódico Nature a maior análise já feita sobre o padrão de crescimento das florestas secundárias na chamada região neotropical

As florestas secundárias, que rebrotam após o desmatamento de uma área, são conhecidas pelo nome algo de capoeiras. A palavra vem do tupi e significa, literalmente, “mato que não é mais”. Vistas como pobres em biodiversidade e jamais tão ricas em estoque de carbono quanto uma floresta primária – a tal “mata virgem”–, as capoeiras são frequentemente desprezadas e outra vez desmatadas. Um estudo lançado nesta sexta-feira (5), porém, deve ajudar a reduzir esse conceito.

Um consórcio internacional de cientistas, que inclui gente de diversas instituições de pesquisa do Brasil, acaba de publicar no periódico Nature a maior análise já feita sobre o padrão de crescimento das florestas secundárias na chamada região neotropical, que vai do México ao Estado de São Paulo.

Eles concluíram que as capoeiras demoram, em média, apenas 66 anos para repor 90% da biomassa (portanto, do estoque de carbono) que possuíam antes do desmatamento. E mais: uma floresta em regeneração sequestra 11 vezes mais carbono do que uma mata virgem na Amazônia.

“Esta é a primeira estimativa da resiliência das florestas secundárias. Sempre houve muita dúvida sobre a taxa de crescimento e a resiliência dessas florestas”, disse ao OC o engenheiro florestal Daniel Piotto, professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Ele é coautor do trabalho, coordenado pelo holandês Lourens Poorter, da Universidade de Wageningen.

A importância das capoeiras da América Latina para o ciclo do carbono e, portanto, para o clima, é evidente. Somente na Amazônia, 22% de toda a área desmatada é ocupada por matas em regeneração, segundo dados do Terraclass, do Inpe. Esse número é provavelmente ainda maior na Mata Atlântica, que tem menos de 10% de sua cobertura florestal original.

No entanto, essa importância nunca havia sido traduzida em números antes. Estudos pontuais mostravam ora que as florestas poderiam entrar em colapso a partir de um certo grau de desmatamento, ora que o crescimento de uma floresta secundária era lento demais para fazer alguma diferença no clima no curto prazo.

“Meus estudos na Zona Bragantina, no leste do Pará, mostravam um tempo de recuperação de 150 anos. Estudos feitos na Venezuela chegavam a 250 anos. A meta-análise [o novo estudo] aponta 66 anos”, disse Ima Vieira, pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi e uma das maiores especialistas em florestas secundárias do país.

Ela também é coautora do trabalho, realizado pelo consórcio autointitulado Amantes da Floresta Secundária – ou “2ndFOR” (“SecondFor”, em inglês), para os menos íntimos.

Os dados anteriores não estão necessariamente errados. O que acontece é que há uma variação gigantesca de tempo de regeneração dentro da zona neotropical, com capoeiras crescendo mais rápido em regiões onde chove mais e onde há mais florestas intactas em volta.

“De posse dessa taxa de crescimento, será possível fazer previsões sobre o potencial de mitigação [de emissões de gases de efeito estufa] das florestas secundárias”, afirmou Piotto.


Mapa
Imagem mostra velocidade de regeneração, medida em biomassa acumulada em 20 anos. 
Quanto maior o círculo preto, maior a taxa de crescimento da floresta.

O consórcio integrou tanto dados coletados pelos pesquisadores em campo quanto resultados de análises anteriores e produziu um mapa mostrando em que regiões as capoeiras absorvem mais carbono e onde absorvem menos. O mapa poderá ser usado pelos formuladores de políticas públicas para priorizar a conservação em florestas de baixa resiliência e incentivar a regeneração em regiões de crescimento rápido da capoeira.

A princípio a notícia é ruim para a Mata Atlântica, já que sua reposição de biomassa é até 70% mais lenta que na Amazônia – e é justamente ali que há mais florestas precisando de regeneração. Piotto diz que isso seria olhar apenas metade do quadro.

“Há muito mais áreas disponíveis para recuperar na Mata Atlântica do que na Amazônia”, afirmou.

O estudo deverá ter também implicações para o cumprimento da meta do Brasil para o Acordo de Paris. A chamada INDC aposta na recuperação de florestas como forma de sequestrar carbono e compensar o que se emite pelo desmatamento legal na Amazônia. O leste do Pará é uma das regiões onde mais vale a pena deixar o mato crescer.

Mas isso só se deixarem mesmo o mato crescer. “Se essas florestas vão resistir no campo depende de questões políticas e institucionais que vão além da nossa pesquisa”, afirmou Ima Vieira. “No que depender dos produtores rurais, não vão, porque eles as veem como empecilho.”

Fonte: O Eco; Agência Fapeam
Imagem: Freepik